
Confissões de um Bispo na Nigéria
Dom Emmanuel Adetoyese Badejo conta sua vocação
OYO, segunda-feira, 31 de agosto de 2009 (ZENIT.org) - Dom Emmanuel Adetoyese Badejo, Bispo auxiliar de Oyo, na Nigéria, ordenado sacerdote em 1986 e Bispo em 2007, compartilhou com Zenit sua vocação sacerdotal. O prelado é autor de vários livros, documentários musicais e de vídeos. No Ano Sacerdotal, Zenit oferece as “confissões” sobre a vocação de Cardeais, Bispos e sacerdotes. A série de depoimentos foi aberta pelo Cardeal Tarcisio Bertone, Secretário de Estado de Bento XVI.
* * *
Sei que muitos sacerdotes que conheço recordariam facilmente uma experiência ou acontecimento através do qual Deus os chamou ao sacerdócio. Eu não pertenço a esta elite. E digo isso com honestidade. Ao contrário de Moisés, Samuel e Paulo, a forma como fui chamado foi uma experiência multidimensional, mas simples, que exige revelar informação “classificada” sobre minha família. No entanto, penso que a ocasião do Ano dos Sacerdotes e dos atuais desafios da Igreja diante do relativismo exigem um pouco de desclassificação das nossas experiências religiosas para benefício de outros.
Cresci em uma família de 7 filhos: 4 meninos e 3 meninas. Aos 4 anos, compreendi que minha família era tridimensional. Para os meus pais e meus dois irmãos mais velhos, a vida era o lar, o trabalho e a Igreja. Simples assim. Para o resto de nós, era um pouco diferente: lar, escola e Igreja. Este tripé caracterizou minha juventude, de forma que só importavam os acontecimentos conectados a estas três esferas da vida. Além disso, descobri que, das três, a Igreja tinha a presença mais dominante, já que aparecia também nos outros dois âmbitos. A escola e a família eram somente outras igrejas. Cresci sentindo que os missionários, sacerdotes e freiras pareciam fazer parte do nosso lar quando iam e vinham, dia e noite, à vontade. Eles pareciam ser os únicos fora de nós, os 7 filhos, para quem não havia nenhum segredo em nosso lar. Sempre ajudaram a minha família em tempos de necessidade – e isso foi muito frequente. Sua presença me mostrava que a Igreja é uma companheira de vida. Quando os missionários nos deixaram, os sacerdotes e religiosas indígenas simplesmente ocuparam seu lugar.
A oração foi outra das guias para a descoberta da minha vocação. Meus pais faziam que a oração da manhã, a oração antes das refeições e antes de dormir fossem imperativas na família. E também havia uma leitura regular da Bíblia. Às vezes, especialmente pelas tardes, quando o tédio podia causar alguma fissura moral na família, meu pai nos envolvia em uma oração de louvor. Todos nós, exceto minha mãe, éramos membros do coral da igreja. A única razão pela qual minha mãe não participava no coral era para não dar a impressão de que o coral da igreja estava personalizado em sua família.
De qualquer forma, às tardes, meu pai abriria o livro familiar de hinos e nos faria cantar. Ao cantar se unia uma batucada com cadeiras, bancos e outros objetos que encontrávamos em nosso humilde lar para marcar o ritmo e o passo. Esta atividade atraía uma pequena audiência, inclusive de famílias muçulmanas que moravam perto e que se uniam ao canto ou simplesmente escutavam por um tempo. Meu pai aproveitava ao máximo as vantagens deste coral bem treinado. Não somente nos fazia cantar de forma regular no coral da igreja e em casa, mas nos levava para rezar e cantar para os doentes e os prostrados nas camas do hospital local, especialmente no Natal e na Páscoa. Ainda que todos os membros da família fossem bons cantores, minha irmã menor e eu quase sempre cantávamos os principais solos. Isso me conferiu um sentido especial de missão e vocação.
Na escola, a vida não era muito diferente. A oração era uma parte central da vida escolar, como se estivéssemos na igreja. No Ensino Fundamental, fui escolhido para os papéis principais quando era preciso cantar ou interpretar personagens, tanto na escola quanto para o público de fora. Já que a maior parte destas atividades tratavam de temas religiosos ou morais, simplesmente me vi chamado a levar a cabo uma função religiosa especial.
Uma experiência que guardei comigo da época do Ensino Fundamental foi a apresentação de uma peça teatral na paróquia. Naquela peça, eu fazia o papel de herdeiro de uma família pagã que havia se convertido ao catolicismo e queria ser padre. Muitos meses depois da apresentação da peça, a maioria das pessoas me chamava de “reverendo padre”. Isso me causou um profundo impacto naquela época. Dirijo meu reconhecimento aos meus professores, que me motivaram a representar aquele papel e a desfrutar da admiração que se derivou disso. Passei de ser o líder mais jovem das bandas musicais a ser o maestro do coral do seminário, fatos que reforçaram minha convicção de que tinha uma missão especial.
Meu pai nos falava constantemente do desejo do seu pai, que foi um rei – meu avô era o líder real, o rei do meu povoado em Ijebu Ode (Nigéria), de onde procedo –, de ter um sacerdote em sua família; e minha mãe nos garantia frequentemente a presença dos nosso fortes anjos da guarda. Ainda que nunca tenham indicado nenhum de nós para o caminho sacerdotal, enviavam-nos à Missa diariamente e nos deixavam claro que, para eles, seria uma grande alegria ter um sacerdote na família. Ainda que fôssemos pobres, eles demonstravam amplamente sua sinceridade com atos de cortesia e generosidade com relação aos sacerdotes e freiras que visitavam nossa localidade e nosso lar. Nem preciso dizer que isso me ajudou a pensar que seria bom converter-me em um sacerdote.
Meus irmãos, por sua parte, haviam se acostumado tanto com a presença de padres e freiras na família, que tornaram muito fácil minha decisão de ser sacerdote. Como coroinha, eu voltava para casa e imitava o padre celebrando a Missa. Eles olhavam para mim mais com reverência que como brincadeira, dando-me a impressão de que estava fazendo algo valioso. Só meu irmão mais velho expressou certa reserva sobre esta minha decisão. Ele já era, no momento em que entrei no seminário, um artista reconhecido; achava que meu outro irmão, que entrou comigo no seminário, se daria melhor como sacerdote, enquanto eu poderia me unir ao seu negócio. Não obstante, ele apoiou ambos, uma vez que fomos para o seminário. Meu irmão seminarista acabou deixando o seminário e depois se casou.
Estes aspectos da minha vida me deixaram bastante claro que Deus tinha uma missão especial para mim. Ao crescer, não tinha a menor dúvida de que, se em algum momento fosse fazer algo importante na vida, seria dentro do contexto dessa Igreja carinhosa e sempre presente.
Dom Emmanuel Adetoyese Badejo
Bispo na Nigéria
Dom Emmanuel Adetoyese Badejo conta sua vocação
OYO, segunda-feira, 31 de agosto de 2009 (ZENIT.org) - Dom Emmanuel Adetoyese Badejo, Bispo auxiliar de Oyo, na Nigéria, ordenado sacerdote em 1986 e Bispo em 2007, compartilhou com Zenit sua vocação sacerdotal. O prelado é autor de vários livros, documentários musicais e de vídeos. No Ano Sacerdotal, Zenit oferece as “confissões” sobre a vocação de Cardeais, Bispos e sacerdotes. A série de depoimentos foi aberta pelo Cardeal Tarcisio Bertone, Secretário de Estado de Bento XVI.
* * *
Sei que muitos sacerdotes que conheço recordariam facilmente uma experiência ou acontecimento através do qual Deus os chamou ao sacerdócio. Eu não pertenço a esta elite. E digo isso com honestidade. Ao contrário de Moisés, Samuel e Paulo, a forma como fui chamado foi uma experiência multidimensional, mas simples, que exige revelar informação “classificada” sobre minha família. No entanto, penso que a ocasião do Ano dos Sacerdotes e dos atuais desafios da Igreja diante do relativismo exigem um pouco de desclassificação das nossas experiências religiosas para benefício de outros.
Cresci em uma família de 7 filhos: 4 meninos e 3 meninas. Aos 4 anos, compreendi que minha família era tridimensional. Para os meus pais e meus dois irmãos mais velhos, a vida era o lar, o trabalho e a Igreja. Simples assim. Para o resto de nós, era um pouco diferente: lar, escola e Igreja. Este tripé caracterizou minha juventude, de forma que só importavam os acontecimentos conectados a estas três esferas da vida. Além disso, descobri que, das três, a Igreja tinha a presença mais dominante, já que aparecia também nos outros dois âmbitos. A escola e a família eram somente outras igrejas. Cresci sentindo que os missionários, sacerdotes e freiras pareciam fazer parte do nosso lar quando iam e vinham, dia e noite, à vontade. Eles pareciam ser os únicos fora de nós, os 7 filhos, para quem não havia nenhum segredo em nosso lar. Sempre ajudaram a minha família em tempos de necessidade – e isso foi muito frequente. Sua presença me mostrava que a Igreja é uma companheira de vida. Quando os missionários nos deixaram, os sacerdotes e religiosas indígenas simplesmente ocuparam seu lugar.
A oração foi outra das guias para a descoberta da minha vocação. Meus pais faziam que a oração da manhã, a oração antes das refeições e antes de dormir fossem imperativas na família. E também havia uma leitura regular da Bíblia. Às vezes, especialmente pelas tardes, quando o tédio podia causar alguma fissura moral na família, meu pai nos envolvia em uma oração de louvor. Todos nós, exceto minha mãe, éramos membros do coral da igreja. A única razão pela qual minha mãe não participava no coral era para não dar a impressão de que o coral da igreja estava personalizado em sua família.
De qualquer forma, às tardes, meu pai abriria o livro familiar de hinos e nos faria cantar. Ao cantar se unia uma batucada com cadeiras, bancos e outros objetos que encontrávamos em nosso humilde lar para marcar o ritmo e o passo. Esta atividade atraía uma pequena audiência, inclusive de famílias muçulmanas que moravam perto e que se uniam ao canto ou simplesmente escutavam por um tempo. Meu pai aproveitava ao máximo as vantagens deste coral bem treinado. Não somente nos fazia cantar de forma regular no coral da igreja e em casa, mas nos levava para rezar e cantar para os doentes e os prostrados nas camas do hospital local, especialmente no Natal e na Páscoa. Ainda que todos os membros da família fossem bons cantores, minha irmã menor e eu quase sempre cantávamos os principais solos. Isso me conferiu um sentido especial de missão e vocação.
Na escola, a vida não era muito diferente. A oração era uma parte central da vida escolar, como se estivéssemos na igreja. No Ensino Fundamental, fui escolhido para os papéis principais quando era preciso cantar ou interpretar personagens, tanto na escola quanto para o público de fora. Já que a maior parte destas atividades tratavam de temas religiosos ou morais, simplesmente me vi chamado a levar a cabo uma função religiosa especial.
Uma experiência que guardei comigo da época do Ensino Fundamental foi a apresentação de uma peça teatral na paróquia. Naquela peça, eu fazia o papel de herdeiro de uma família pagã que havia se convertido ao catolicismo e queria ser padre. Muitos meses depois da apresentação da peça, a maioria das pessoas me chamava de “reverendo padre”. Isso me causou um profundo impacto naquela época. Dirijo meu reconhecimento aos meus professores, que me motivaram a representar aquele papel e a desfrutar da admiração que se derivou disso. Passei de ser o líder mais jovem das bandas musicais a ser o maestro do coral do seminário, fatos que reforçaram minha convicção de que tinha uma missão especial.
Meu pai nos falava constantemente do desejo do seu pai, que foi um rei – meu avô era o líder real, o rei do meu povoado em Ijebu Ode (Nigéria), de onde procedo –, de ter um sacerdote em sua família; e minha mãe nos garantia frequentemente a presença dos nosso fortes anjos da guarda. Ainda que nunca tenham indicado nenhum de nós para o caminho sacerdotal, enviavam-nos à Missa diariamente e nos deixavam claro que, para eles, seria uma grande alegria ter um sacerdote na família. Ainda que fôssemos pobres, eles demonstravam amplamente sua sinceridade com atos de cortesia e generosidade com relação aos sacerdotes e freiras que visitavam nossa localidade e nosso lar. Nem preciso dizer que isso me ajudou a pensar que seria bom converter-me em um sacerdote.
Meus irmãos, por sua parte, haviam se acostumado tanto com a presença de padres e freiras na família, que tornaram muito fácil minha decisão de ser sacerdote. Como coroinha, eu voltava para casa e imitava o padre celebrando a Missa. Eles olhavam para mim mais com reverência que como brincadeira, dando-me a impressão de que estava fazendo algo valioso. Só meu irmão mais velho expressou certa reserva sobre esta minha decisão. Ele já era, no momento em que entrei no seminário, um artista reconhecido; achava que meu outro irmão, que entrou comigo no seminário, se daria melhor como sacerdote, enquanto eu poderia me unir ao seu negócio. Não obstante, ele apoiou ambos, uma vez que fomos para o seminário. Meu irmão seminarista acabou deixando o seminário e depois se casou.
Estes aspectos da minha vida me deixaram bastante claro que Deus tinha uma missão especial para mim. Ao crescer, não tinha a menor dúvida de que, se em algum momento fosse fazer algo importante na vida, seria dentro do contexto dessa Igreja carinhosa e sempre presente.
Dom Emmanuel Adetoyese Badejo
Bispo na Nigéria
Nenhum comentário:
Postar um comentário