sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Homilia Lc 5,1-11: Pela tua palavra, lançarei as redes



Ano C
V Domingo Comum
Is 6,1-2a.3-8
Sl 137
1Cor 15,1-11
Lc 5,1-11


Pela tua palavra, lançarei as redes


O Senhor procura alguém que possa enviar. Ele se fez presente entre nós pela Palavra. Ele veio ao nosso encontro na força e suavidade da Palavra. No Evangelho há o encontro da Palavra com o pescador: lança a rede, busca águas mais profundas. E na Palavra do Senhor nasce a nossa palavra: pela tua Palavra lançarei a rede.

A Palavra! A Palavra que lança, desaloja, faz lançar as redes. A Palavra que nos lança como uma rede e nos enche das dádivas do amor; impulsiona, direciona e faz trilhar outras veredas, perfazer outros caminhos em busca do abismo do amor d’Aquele que tudo cria, recria, deixa ser todo o universo.

A Palavra do Senhor! Deus despertador dos que jazem na sonolência da indiferença, Deus purificador dos corações endurecidos, Deus procurador de mensageiros, Deus suscitador de profetas, Deus perscrutador dos corações, Deus gerador de homens novos e livres; Deus amante de seu povo, está sempre buscando até encontrar alguém que esteja bem disposto, livre, para enviar.

A Palavra translúcida, dizia Isaías, que deixa ver: eu vi o Senhor. A Palavra indicativa, narradora, pintora. Palavra mensagem: faz ver. E quando na Palavra vemos o Amor que não é amado os gonzos de nossa existência tremem, tremem os fundamentos de nosso existir. Palavra que despe toda a nossa pessoa, ilumina a nossa fraqueza, a finitude; aflora a pequenez e a impureza de nosso ser e balbuciamos: ai de mim sou um homem fraco e de existência breve; Senhor, afasta-te de mim, porque sou um pecador; um verme, um servo inútil!

Na inutilidade, no nada, na fraqueza reconhecida e abraçada, a brasa ardente do amor purifica, transforma. E tocado, purificado, revigorado, pela Palavra ardente, quente, reverente, qual brasa ardente de amor “Quem enviarei? Quem irá por nós?”, não nos retraiamos, não resistamos, não fujamos, mas respondamos: Aqui estou! Envia-me. Um eis-me aqui de quem ouviu a voz do Senhor que diz: Quem enviarei? Quem irá por nós? Aqui estou com uma resposta-pedido: Envia-me!

A brasa da Palavra-ardente do altar das núpcias de Deus, a ardência do amor verdadeiro, tocou os nossos lábios para purificar e transformar a nossa pessoa para que nascesse uma nova palavra: a nossa. O carvão incandescente do amor toca e purifica o nosso ser e torna-nos audazes, livres. Nesse toque sagrado do encontro da purificação do nosso coração, agora livre, somos capazes de, na palavra, declarar o nosso amor: Eis-me aqui, envia-me. Senhor, se é teu desejo, se é tua vontade, eis-me aqui. Se sou agradável a teus olhos eis-me aqui. Na minha indignidade, purificado com o fogo de teu Espírito, eis-me aqui e envia-me!

A nossa Palavra-sim diante da Igreja é o transbordamento do nosso coração, o desejo da nossa correspondência amorosa. Uma correspondência sem trocas, sem exigências, na gratuidade e liberdade. Por isso, o nosso eis-me aqui será livre, incondicionado, em todos os instantes, em todos os momentos, em todas as situações. Eis-me aqui repetido todos os dias de nossa vida, nas alegrias e esperanças, nas dores e alegrias, nos desânimos e fracassos, nas frustrações e realizações. Eis-me aqui nas perdas, nos danos, no sofrimento, na solidão da cruz.

O eis-me aqui de um esmoler, peregrino, viandante, suplicante, que sempre, somente, livremente, gratuitamente, como o Pobre de Assis, apenas balbuciante, disposto e exposto, se faz palavra: Eis-me aqui... Pela tua palavra lançarei a redes!

Um eis-me aqui “abraâmico”. Abraão acreditou na Palavra e tornou-se o pai de todos os que crêem. Ele se fez palavra da fé. Ainda em nossos dias ele é a fala para aqueles e aquelas que ouvem a Palavra e põem-se a caminho, sem olhar para trás. Ele, no dizer do Apóstolo-missionário, também nos convida hoje e nos envia. Não duvidemos da promessa divina, mas creiamos no Deus que tem poder para cumprir o que prometeu. Ele cumprirá, pois é fiel em seu amor; Ele deu a sua Palavra. Seremos também pai de muitos povos. Como homens de fé, de esperança em esperança, não fraquejaremos mesmo quando fisicamente nos faltarem as forças.

Um homem imitador de Deus, um homem de Deus, gera sempre. Será capaz de gerar virtudes e filhos mesmo quando pensar que seu coração, à vista de seu físico desvigorado, não mais é capaz de gerar. Se é fecundo sempre quando se confia e espera na Palavra do Senhor!

As noites e os dias trabalhados sem resultado aparente são apenas um convite a buscar águas mais profundas, até que já não sejamos nós a viver, mas Cristo vivendo em nós. Em Cristo transformado, de Cristo revestido, a nossa palavra seja a transparência da Palavra que é Jesus. Na busca de águas mais profundas procuremos não o que é nosso, mas o que é de Cristo para que Cristo seja tudo para nós e o percebamos em tudo.

Sendo tudo para nós, diremos: na atenção, na tensão de tua Palavra, na força, no vigor, no sabor de tua Palavra, na confiança, de tua Palavra, Senhor, lançaremos as redes. No tom, na ressonância, na sintonia de tua Palavra lançaremos as redes. Sempre iluminados, reforçados, revigorados, confortados, impulsionados pela tua Palavra nós lançaremos as redes e nos deixaremos lançar com uma rede.

A tua Palavra é tudo para mim! Como viver sem a tua Palavra, a Palavra do meu Amado, a palavra do meu amor, o meu bem querer? Então, Senhor, já não a minha, mas a tua, a tua feita toda minha, na minha a tua, nada de minha que não seja a tua.

Assim, pela Palavra Dele feita toda nossa, sejamos padres-discípulos que tenham uma profunda experiência de Deus, configurados com o coração do Bom Pastor, dóceis às orientações do Espírito, que se nutrem da Palavra de Deus, da Eucaristia e da oração; sejamos padres-missionários movidos pela caridade pastoral que nos leve a cuidar do rebanho a nós confiado e a procurar os mais distanciados pregando a Palavra de Deus, sempre em profunda comunhão com toda a Igreja; sejamos padres-servos da vida, que estejamos atentos às necessidades dos mais pobres, comprometidos na defesa dos direitos dos mais fracos e promotores da cultura da solidariedade (DAp 199). Sejamos padres cheios de misericórdia, reconciliadores e anunciadores da paz e do bem (DAp 198). O amor aos pobres e sofridos será uma fonte espiritual inesgotável e, ao mesmo tempo, será o cuidado para com os pobres que animará e unificará a nossa vida e o nosso ministério de padres.

Como Daniel sejamos um padre interpretador dos sonhos do povo, indiquemos a grandeza do Reino de Deus e mostremos os pés de barro quando se busca o poder e a riqueza. A minoridade presenteia fecundidade e ousadia ao nosso sacerdócio.

E ainda, ao pronunciarmos a palavra da Palavra: Eis o meu corpo, eis o meu sangue, tomai e comei, tomai e bebei, seja a Palavra da transformação, da presencialização, mas, também da nossa entrega ao Povo.

Somos todos convidados a deixarmo-nos tomar pela Palavra de Deus. Somos provocados pela Palavra a dizermos: eis-me aqui, envia-me. Cada um de nós e especialmente nós, sacerdotes! Somos todos tocados pelo fogo do amor de Deus, então porque não brota livremente de nossa boca o eis-me aqui, envia-me? Somos todos convidados a buscar águas mais profundas, a buscar o abismo de amor que nos provoca a sermos, como Abraão, homens e mulheres da fé. Seguidores do Servo inútil, deixemo-nos tomar pela provocação de uma vida dada, doada, com gosto de parusia. Deixemo-nos tomar pela Palavra que o Pai nos enviou, a Pessoa de Jesus Cristo, e peçamos a graça de sermos anunciadores do Reino.

Pela tua Palavra lançarei a rede!

TU, PALAVRA, incendeia meu ser!

Fonte:
Franciscanos.org

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