sábado, 27 de março de 2010

Comentário sobre a Liturgia da Palavra, Lc 22, 14-23, 56: Aprende a carregar Cristo



Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor
Ano C
Is 50,4-7
Sl 21
Fl 2,6-11
Lc 22, 14-23, 56


Aprende a carregar Cristo

Não foi por prazer que o Senhor do mundo, em sua condição humana, apareceu publicamente montando em uma jumenta. O que ele desejava, por um misterioso segredo (ou mistério latente), era penetrar no âmago dos corações, selar o íntimo de nossa alma e, como místico cavaleiro, aí tomar assento, corporalmente. Assim, por sua divindade, poderia dirigir os passos da alma, refreando os impulsos da carne e, habituando os pagãos àquela amorosa direção, disciplinar-lhes os sentimentos. Felizes os que, sobre o dorso da alma, acolheram tal cavaleiro! Realmente felizes os que, tendo os lábios contidos pelas rédeas do Verbo celeste, não se dissiparam na loquacidade.

E que rédea será essa, irmãos? Quem me ensinará como se pode reprimir ou soltar os lábios dos homens? Mostrou-me tal rédea aquele que disse: Que a palavra seja colocada em minha boca, de maneira que eu possa falar abertamente (cf. Ef 6, 19). A palavra é, pois, uma rédea, mas também um aguilhão. É difícil teimares contra o aguilhão! (At 26, 14). Foi o Senhor quem nos ensinou a abrir o coração, a suportar o aguilhão, a carregar o jugo. Que um outro nos ensine a suportar o freio da língua; pois mais rara é a virtude do silêncio que a da palavra. Sim, o que nos ensinou aquele que, como mudo, não abriu a boca contra a impostura e, pronto para as chicotadas, não recusou os golpes, a fim de tornar-se um suave assento para o Senhor?

Aprende, de um familiar de Deus, a carregar Cristo, pois ele, outrora, te carregou quando, como pastor, reconduzia a ovelha desgarrada; aprende a oferecer, de bom grado, o dorso de tua alma, aprende a ficar sob Cristo, para que possas ficar sobre o mundo. Não é qualquer um que transporta facilmente Cristo, mas quem é capaz de dizer: Meu coração grita e geme de dor, esmagado e humilhado demais (Sl 37 [38], 9).

Com efeito, se desejas não ser abalado, coloca teus passos pacificados sobre as vestes dos santos; na verdade, cuida para não caminhares com os pés enlameados; acautela-te para não te embrenhares pelos desvios, abandonando o caminho dos profetas. Pois, a fim de proporcionar um percurso mais seguro para as nações que haveriam de chegar, os que precederam Jesus cobriram, com as próprias vestes, o caminho até o templo de Deus. Para que avances sem tropeço, os discípulos do Senhor despojaram-se, pelo martírio, de suas vestes, para aplainar-te um caminho através da multidão hostil.


Santo Ambrósio, Bispo
Commentarium in Lucam, liber 9, 9-11
Sources Chrétiennes 52, 143-144

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